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Antes do futebol, a luta: Al-Ahly nasceu como símbolo de resistência ao colonialismo
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Antes do futebol, a luta: Al-Ahly nasceu como símbolo de resistência ao colonialismo

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Aventuras Na História
19/06/2025 11h00
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Em setembro de 1882, os britânicos derrotaram o exército egípcio em Tel El Kebir e assumiram o controle do país — que até então era submetido ao Império Otomano. A ocupação inglesa no Egito se deu por dois motivos: um de teor estratégico e outro de ordem econômica. 

O primeiro fator se refere a construção do Canal de Suez, em 1869, que se tornou  importante passagem que ligava os oceanos orientais ao mar Mediterrâneo. O segundo ponto diz respeito ao fato do Egito ser o maior produtor de algodão do mundo na época. 

Por conta disso, os britânicos se mantiveram por lá por 72 anos, até a Revolução Egípcia de 1952, que tornou o país uma república. E é justamente neste contexto de ocupação britânica que surgiu o Al-Ahly. 

Um dos clubes mais tradicionais do país, o Al-Ahly enfrenta o Palmeiras nesta quinta-feira, 19, a partir das 13 horas (de Brasília), pela segunda rodada da Copa do Mundo de Clubes da FIFA. Conheça a história anticolonialista do Al-Ahly!

Partida entre Al-Ahly e Inter de Miami pela Copa do Mundo de Clubes da FIFA - Getty Images

Criado para os estudante

Se o Brasil ainda hoje é considerado o país do futebol, sendo a nação com mais representantes na Copa do Mundo de Clubes da FIFA, o esporte não deixa de ter sua importância e de fazer parte da identidade cultural do Egito. 

O futebol no mundo árabe começou com a fundação de dois clubes no Cairo, há mais de um século, e sempre refletiu a política do país, indo desde a luta anti-imperialista até as revoltas da Primavera Árabe. 

Segundo o site oficial do governo do Egito, o Al Ahly foi fundado em 1907, como uma forma de unir jovens de diferentes escolas do ensino médio — que haviam se tornado muito importantes na luta contra o colonialismo.

Imagem ilustrativa - Getty Images

O Al Ahly também simbolizava a classe trabalhadora. Não por acaso, se tornou o "Time do Povo". Do outro lado temos o Zamalek Sports Club, de 1911, que representa a elite, os administradores estrangeiros e os militares. 

"O futebol é algo muito importante no Egito", disse Adel Abdel Ghafar, estudante de doutorado cujo bisavô foi cofundador do clube Al Ahly, ao estudioso de futebol do Oriente Médio James Dorsey, em 2012, repercute o portal The National.

É como uma religião. Na maioria dos países, você nasce judeu, muçulmano ou cristão. No Egito, você nasce Ahly ou Zamalek. As pessoas não perguntam qual é a sua religião, elas perguntam seu time".

E a rivalidade entre os dois grupos vem bem antes de suas fundações. Afinal, no Egito, no século 20, o esporte, importado pelos britânicos, se espalhou dos acampamentos militares até as cidades — onde floresceu como símbolo da resistência imperial.

Debate pela identidade nacional 

Em meados de 1905, o advogado e ativista egípcio Mustafa Kamil fundou o Clube de Estudantes para pessoas excluídas de clubes sociais para estrangeiros e da elite. Dois anos depois, tornou-se oficialmente o Al Ahly Sporting Club.

O Al-Ahly (palavra árabe para "o nacional") adotou o vermelho e o branco da bandeira egípcia pré-colonial. Um fato curioso é que Saad Zaghloul, líder da revolução de 1919, se tornou o primeiro presidente da Câmara dos Comuns do clube. Conforme o Al-Ahly vencia suas partidas, aumentavam os protestos contra o domínio britânico. 

Do outro lado estava George Marzbach, advogado belga que, em janeiro de 1911, fundou o Qasr El Nil — em homenagem à localização de sua primeira sede. Aberto a todos os grupos econômicos e étnicos, o clube mudou de sede e nome para El Mokhtalat ("o misto") em 1913.

Nas décadas seguintes, a rivalidade entre os clubes refletia o acirrado debate sobre a identidade nacional. Um exemplo disso ocorreu em 1925, no auge da luta do Egito por sua independência. Nesse ano, a assembleia geral do Al Ahly proibiu a filiação de estrangeiros; enquanto o El Mokhtalat manteve sua reputação de clube da elite, chegando a mudar seu nome para o do monarca egípcio, Rei Farouk.

Mas tanto o nome quanto o reinado de Farouk não duraram muito. Afinal, o rei, impopular por sua condução da Guerra Árabe-Israelense de 1948 e seu estilo de vida decadente, foi deposto no Golpe dos Oficiais Livres de 1952; que teve liderança de Muhammad Naguib e Gamal Abdel Nasser. Após isso, o clube mudou de nome pela última vez, agora em homenagem ao seu bairro: Zamalek.

Quatro anos depois, em 1956, Nasser se tornou presidente do país e também foi nomeado presidente honorário do Al-Ahly. Entre seus projetos estava a construção do Estádio Internacional do Cairo, que foi concluído em 1960. 

Mas as coisas mudaram em 1967, quando o próprio Nasser proibiu o futebol no país, apontando que a prática esportiva era uma distração após a Guerra dos Seis Dias. O embargo durou até sua morte, em 1970, quando a decisão foi revogada por seu sucessor: Anwar Sadat.

Assim como Sadat, o ditador Hosni Mubarak (que veio depois de Anwar) também torcia pro Al-Ahly; o que fez com que ambos tentassem usar o futebol como propaganda para aumentar sua popularidade e como veículo para fortalecer a identidade nacional

Não por acaso, entre a morte de Nasser e a queda de Mubarak, em 2011, o país venceu cinco vezes a Copa Africana de Nações, se tornando o país mais vitorioso do continente. 

Os ultras

A feroz rivalidade entre Al-Ahly e Zamalek ganhou novos traços a partir dos anos 2000, coincidindo com a ascenção dos Ultras: fãs de futebol conhecidos por seu apoio fanático e disposição para organizar manifestações em grande escala — inspirados nos hooligans europeus, mas sem adotarem uma ideologa de direita ou de violência niilista. 

Grupos como os Ultras White Knights (Zamalek) e os Ultras Ahlawy (Al-Ahly) eram anti-autoritários e anti-comerciais, além de defenderem o coletivismo e a resistência.

Eu era contra a corrupção e o regime e a favor dos direitos humanos. O anarquismo radical era o meu credo. Os ultras ignoram o sistema. Você faz o seu próprio sistema porque já é dono do jogo. Nós nos vemos como organizadores da anarquia. Nosso poder estava focado em organizar o nosso sistema", disse Mohamed Gamal Besheer, padrinho do movimento ultra egípcio e autor de Kitab Al Ultras (O Livro dos Ultras).

Formados como grupos apolíticos e não religiosos, eles se tornaram cada vez mais politizados como resposta aos confrontos policiais frequentes. "Os eventos da Primavera Árabe de 2011 politizaram ainda mais os Ultras e os transformaram em atores revolucionários", explica Connor Jerzak, acadêmico do Oberlin College, em Ohio, em um artigo no ano passado para a Interface, uma revista acadêmica que estuda movimentos sociais.

Imagem ilustrativa - Getty Images

Quando a Primavera Árabe chegou ao fim, os Ultras já sabiam como se mobilizar. "Não quero dizer que fomos os únicos responsáveis ​​pela queda de Mubarak", disse Assad, líder do Al Ahlawy.

"Nosso papel era fazer as pessoas sonharem, fazendo-as saber que, se um policial te agredir, você pode revidar, não simplesmente fugir… Nosso papel começou antes da revolução. Durante a revolução, havia a Irmandade Muçulmana, os ativistas e os Ultras. É isso".

Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião do TIM NEWS, da TIM ou de suas afiliadas.
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