Por que procurar o diagnóstico de autismo na fase adulta?

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Mais de 2 milhões de brasileiros são autistas, segundo o último censo divulgado pelo IBGE . E você provavelmente conhece alguém que recebeu o resultado há pouco tempo. Alguns desses diagnósticos de autismo têm chegado a pessoas adultas que até então viviam como se fossem apenas pessoas complicadas, tímidas, antissociais, dentre outros títulos. E esse é o meu caso.
É importante dizer que ao mesmo tempo em que pudesse ser lido como “esquisito”, também era visto como “normal” por muitos que nem imaginavam o que eu enfrentava. O autismo não é uma doença. É uma condição de neurodivergência. Uma forma diferente de funcionamento do cérebro . Existem autistas de nível 1, 2 e 3 de suporte, que variam conforme a necessidade que cada indivíduo tem de suporte na vida.
Evolução da condição
Com o tempo, pessoas autistas de nível 1 de suporte, como é o meu caso, costumam a aprender a mascarar os sinais . Principalmente quando se trata de pessoas com altas habilidades ou superdotação. E assim foi comigo. Primeiro eu evitava falar. Me concentrava em observar as pessoas, suas expressões. Treinava e revisava diálogos freneticamente. Não que eu tenha deixado de agir assim, mas muita coisa mudou.
Depois de sucessivas depressões e algumas tentativas de suicídio, desde a infância, e a constante sensação de que havia algo inexplicado, procurei em 2020 uma psicóloga levando a ela a suspeita de “borderline”. Até aquele momento havia passado por mais de dez profissionais, que haviam sido sim eficientes de uma maneira pontual. Mas restava sempre uma sensação de incompletude no tratamento que, por isso, eram descontinuados.
Busca por ajuda
Dessa vez, no entanto, as sessões evoluíram bem, propiciando que eu conseguisse distinguir e até solucionar alguns problemas antigos ou encontrar formas sadias de lidar com eles. Essa experiência me ajudou a enfim reconhecer que havia de fato algo perdido no meu passado. Foi então que voltei a trazer para a terapia a busca por uma resposta. Mas a psicóloga não conseguia mais me ajudar.
Enquanto isso, a vida começou me exigir a tal resposta. Passei a encontrar sérios problemas de convivência e de adaptação no trabalho e entrei novamente em depressão. A verdade é que a terapeuta, embora competente, não estava capacitada para me ajudar a chegar à resposta da minha pergunta. Esse é um problema que muitos autistas enfrentam. Há poucos profissionais habilitados para chegarmos ao diagnóstico .
Descoberta do autismo
Recebi meu diagnóstico pouco antes de completar 39 anos, por um psiquiatra com quem já me consultava por três anos. Ele examinou com cuidado meu passado e leu um extenso relatório que escrevi num dia de intenso hiperfoco. Senti a famosa sensação de alívio, como é relatada por muitas pessoas nessa mesma situação. Eu não era “problemático” ou “fresco demais” por não suportar certas experiências que para os outros pareciam ordinárias. Viajar num ônibus lotado, trabalhar todos os dias num escritório com outros colegas e conversar na hora do cafezinho, por exemplo.
Para fazer como os outros, eu precisava deixar de viver coisas importantes. O fim de semana muitas vezes se tornava em dias trancados em casa para me recuperar da rotina semanal. Agora eu passo a entender e a respeitar os meus limites. Procurando formas de lidar com eles sem me prejudicar.
Para isso, atualmente, além do acompanhamento psiquiátrico, faço terapia com uma neuropsicóloga especialista em Transtorno do Espectro Autista e com um psicólogo que presta atendimento na Gestalt-terapia. Apesar dos altos e baixos, como todo mundo, nunca estive tão sadio mentalmente . Pois pela primeira vez tenho o suporte adequado e qualificado que preciso.
Importância de falar sobre autismo
Ao contrário do que às vezes se faz parecer nas campanhas relacionadas ao tema, autismo não é coisa de criança. Quem é autista, nasce autista . Mas, como é de se esperar, um dia cresce e tem de encarar a vida adulta. Mesmo que chegue à velhice sem um diagnóstico.
Se você suspeita que tenha sinais de autismo, procure um psiquiatra, um neurologista ou neuropsicólogo habilitado. Além dos direitos relacionados, você pode se conhecer melhor e aprender a se respeitar mais, encontrando assim maior qualidade na sua vida. Mas nunca se esqueça: o autismo é um espectro. Portanto, ele pode variar como irá aparecer junto a cada personalidade.
*Texto escrito por Thiago Prado
*Thiago Prado é escritor, artista visual, cineasta e escritor. Na mais recente publicação “Que será, será”, ele aborda o ser e o sentir no mundo contemporâneo.


