A exilada Romanov que fugiu da Revolução Russa e reinventou a moda

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Embora não seja um dos temas que as pessoas mais recordem sobre quando estudaram história na escola, a Rússia possui um passado bastante próprio e que, quando observados, percebemos que são relativamente recente.
Por exemplo, ela só viu a queda de seu império há pouco mais de 100 anos, durante a Revolução Russa, que ocorreu entre 1917 e 1923, estabelecendo a União Soviética.
Logo após a revolução, o que aconteceu pode parecer bastante chocante hoje em dia: a família imperial, os Romanov — o czar Nicolau II, sua esposa Alexandra e seus cinco filhos — foram executados por ordem do governo bolchevique, que temia que a família se tornasse um ponto de apoio para a restauração da monarquia, em 17 de julho de 1918.
Porém, é claro que não seria simples extinguir todos os membros de uma linhagem histórica. E uma das sobreviventes teve uma jornada bastante curiosa ao longo de sua vida, tornando-se um ícone da moda, socialite e atriz, construindo uma nova vida na França e nos Estados Unidos.
Natália Pavlovna Palei
Nascida no dia 5 de dezembro de 1905, Natália Pavlovna Palei era filha do mais novo Grão-Duque Paulo Alexandrovich com sua segunda esposa, Olga. Conforme repercute a revista Smithsonian, o próprio relacionamento já começou com um escândalo.
Começando pelo fato de que Paulo já foi casado antes, sua primeira esposa foi Alexandra da Grécia e Dinamarca, que faleceu devido a complicações no parto durante o nascimento de seu segundo filho, Dmitri Pavlovitch, em 1891; a primeira foi Maria Pavlovna, que nasceu no ano anterior.
Viúvo, Paulo acabou se apaixonando por Olga, uma plebeia que era casada e já tinha quatro filhos, além de ser uma pessoa muito abaixo de sua posição. Eles começaram um caso e, em 1897, ela deu à luz a um filho de Paulo, Vladimir, enquanto ainda era casada com seu primeiro marido. Porém, logo depois ela se separou, e passou a viver junto de seu verdadeiro amado.
Quando Paulo pediu permissão ao czar para se casar, Nicolau recusou. Mesmo assim, eles não desistiram da relação, e acabaram sendo banidos para a França — onde, pelo menos, ainda poderiam viver confortavelmente com sua família. Em 1903, eles tiveram Irina e, em 1905, Natália.

Durante sua infância, Natalia e seus irmãos desfrutaram de uma vida ainda repleta por grande conforto. Sua mãe conseguia dar festas anuais frequentadas pelas elites culturais russas e de Paris, e ela passou seus primeiros anos rodeada por ambientes elegantes e grande luxo.
Eventualmente, Nicolau perdoou seu tio e, em 1914, Paulo e sua família retornou para a Rússia, passando a viver em um palácio recém-construído nos arredores de São Petersburgo. As crianças passaram algum tempo inclusive com seus meio-irmãos mais velhos, frutos dos primeiros casamentos de seus pais, e também com seus primos — os filhos de Nicolau com sua czarina, Alexandra.
Inclusive, sua meia-irmã, Maria, registrou que a jovem Natalia era "alegre e animada, com um nariz arrebitado; bochechas rechonchudas e rosadas; e lindos cachos loiros". Em 1915, tudo já estava tão bem-resolvido, que Nicolau até mesmo concedeu a Olga e seus filhos com Paulo os títulos de princesas e príncipe.
Revolução Russa
Apesar da aparente alegria, a família Palei chegou à Rússia em um momento crítico, em que o império sentia na pele o aparente declínio. O povo, cansado da monarquia autocrática, buscou reformas, que mesmo com concessões oferecidas por Nicolau, não foram contidas.
Mas com a chegada da Primeira Guerra Mundial em 1914, poucos meses após a chegada da família na Rússia, o pai e o irmão de Natália precisaram servir no exército russo, como comandante de um corpo da Guarda Imperial e como soldado na linha de frente, respectivamente. Com o começo do conflito, pelo menos, o governo do czar ficou um pouco mais forte, e a revolução foi momentaneamente contida.
Porém, fracassos militares de Nicolau e decisões ruins de Alexandra — que passou a supervisionar os assuntos domésticos enquanto o marido liderava esforços de guerra — condenaram a dinastia. Em paralelo, também corriam rumores de que alguém da própria família do czar, como seu tio Paulo, poderia tomar o poder do czar para si.

De qualquer forma, tudo culminou com a abdicação de Nicolau ao trono em março de 1917, ou seja, ainda em meio à Primeira Guerra. Ainda assim, Paulo e Olga optaram por permanecer na Rússia, e acabaram sendo colocados em prisão domiciliar. No ano seguinte, os membros masculinos da casa imperial foram convocados a se apresentarem para registro — na verdade, seria para suas próprias execuções —, mas como Paulo estava doente, foi dispensado; Vladimir, então com 21 anos, não teve a mesma sorte.
Foi só em 28 de janeiro de 1919 que Paulo e outros três grão-duques foram executados, deixando, assim, Olga viúva. Ela então fugiu para a Finlândia — para onde enviou suas duas filhas em dezembro de 1918, quando Natália tinha cerca de 13 anos —, e com isso pôde escapar do derramamento de sangue da revolução.
Nova vida
Após se encontrarem na Suécia, onde se estabeleceram inicialmente, Olga, Irina e Natáliavoltaram para a França, onde já tinha vivido anteriormente. Nesse momento, já não eram mais ricos como membros de uma monarquia, mas ainda puderam vender uma casa que tinham em Boulogne e viver tranquilamente nos anos que se seguiram.
Em Paris, Olga passou a se dedicar especialmente à comunidade de emigrantes russos, e organizava bailes anuais, frequentados por milionários americanos e membros da burocracia e aristocracia europeia. Em 1924, então com 19 anos, Natália fez sua estreia na sociedade; e apenas três anos depois se casou com o estilista francês Lucien Lelong.
Após a morte de Olga, que pereceu para um câncer em 1929, aos 62 anos, Natália teve uma ruptura ainda maior com sua antiga vida na Rússia. Nesse momento, ela era conhecida pelo nome "afrancesado" Natalie Paley, e tinha suas próprias polêmicas em que estava envolvida — como relações fora do casamento, como com um dançarino chamado Serge Lifar, e depois com o escritor francês Jean Cocteau.
Inclusive, algo que marcou sua fama era a aparente afinidade por homens que também tinham interesse por outros homens. Por isso, um amigo inclusive a descreveu como uma pessoa que "foi feita para ser amada e não para amar. Ela é uma planta exótica que, para prosperar, precisa de elogios, espelhos e lustres lisonjeiros. Ela sabe disso. Aqui estão todos os homens a seus pés".
Ainda como uma figura conhecida na alta sociedade, Paley fez grande sucesso como modelo. Porém, a fama que ela sonhava ainda era outra: ela queria viajar para os Estados Unidos, e ser uma estrela de cinema.

Últimos anos
Do outro lado do Oceano Atlântico, Natalie Paley ficou conhecida primeiro como uma "prima do falecido czar determinada a garantir sucesso no cinema". Porém, seu sonho enfrentou alguns empecilhos, como seu sotaque muito forte para os ouvidos americanos, e também o mero fato de que não era uma atriz talentosa. Ela chegou a aparecer em vários filmes franceses mal recebidos, antes de ir para os Estados Unidos na década de 1930.
Após passar vários anos longe de seu marido, ela pediu o divórcio em 1936, quando estrelou seu último filme, o francês 'Les Hommes Nouveaux". Nos Estados Unidos, se casou novamente, dessa vez com o produtor de teatro John C. Wilson, com quem viveu em harmonia por muitos anos.
Embora não fosse atriz, Paley ainda era frequentemente reconhecida por sua beleza, e seguiu trabalhando como modelo e frequentando a cena social, dessa vez de Nova York. Em 1941, se naturalizou como cidadã americana, e seguiu mantendo várias conexões culturais bastante interessantes na primeira metade do século 20.
Porém, Wilson enfrentava o vício em álcool, e sua carreira fracassou, falecendo em 1961 e deixando, assim, Paley viúva. Desde então, ela passou a viver de maneira mais reclusa, tendo seus animais de estimação como companhia, até sofrer uma queda no banheiro e quebrar o pescoço em dezembro de 1981, quando tinha 76 anos.


