Calígula, o Imperador Farmacêutico? Novo estudo revela lado oculto do romano

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Conhecido por suas extravagâncias, crueldades e decisões aparentemente insanas, o imperador romano Calígula ganha agora um novo contorno. Um estudo recente, publicado nos Anais da Academia Europeia de Ciências e Artes, propõe que o imperador detinha um surpreendente domínio sobre práticas médicas antigas, com destaque para o uso do heléboro, uma planta de forte ação terapêutica (e tóxica), associada à cidade grega de Antikyra.
Os autores do estudo, Andrew J. Koh, da Universidade de Yale, e Trevor S. Luke, da Universidade Estadual da Flórida, revisitam uma breve anedota registrada por Suetônio. Nela, Calígula ordena a execução de um senador que buscava prolongar sua licença médica em Antikyra, onde se tratava com heléboro:
Uma sangria era necessária para alguém a quem o heléboro não havia beneficiado durante todo esse tempo", teria ironizado o imperador.
Lida por séculos como uma piada mórbida típica do sadismo de Calígula, a frase ganha agora uma nova interpretação: a de alguém familiarizado com o raciocínio médico de sua época.
Segundo os pesquisadores, a frase ecoa conceitos encontrados em tratados como 'De Medicina', de Celso, e sugere que Calígula compreendia tanto o tempo de ação do heléboro quanto outras práticas terapêuticas alternativas, como a sangria.
Essa percepção foi reforçada por pesquisas do Programa de Farmacologia Antiga de Yale (YAPP), que cruzaram dados de textos clássicos com estudos etnobotânicos contemporâneos na Grécia.
Antikyra, que já era conhecida desde o século 1 a.C. como destino de um primitivo "turismo médico", ficou famosa por suas poções curativas que combinavam heléboro com outras ervas para atenuar sua toxicidade. O tataravô de Calígula, Marco Lívio Druso, foi tratado com sucesso na cidade por epilepsia em 91 a.C., um elo familiar que pode ter influenciado o interesse do imperador.
Textos antigos sugerem que o próprio Calígula sofria de insônia, epilepsia e instabilidade mental — doenças que tradicionalmente eram tratadas com o heléboro. Além disso, o clima de paranoia na corte romana, especialmente após a morte suspeita de seu pai, Germânico, pode ter levado o imperador a estudar venenos, antídotos e práticas médicas não apenas por interesse, mas por instinto de sobrevivência.
Outras fontes também corroboram essa nova leitura. O filósofo Filo de Alexandria, crítico severo de Calígula, admitia que o imperador possuía vastos conhecimentos práticos, inclusive sobre medicina, embora o acusasse de perverter o ofício de cura para fins pessoais.
Revisão
Embora o estudo não tente absolver ou reabilitar a figura de Calígula, sugere uma imagem mais complexa e menos caricatural do imperador. Para Koh e Luke, o conhecimento médico do imperador, até então interpretado como evidência de loucura ou sadismo, pode ter sido intencionalmente distorcido em narrativas históricas com propósitos políticos.
Segundo o 'Archaeology News', a pesquisa, ao lançar nova luz sobre a relação entre poder, medicina e retórica política na Roma Antiga, convida à revisão crítica das fontes e das histórias que, por séculos, moldaram a reputação dos grandes — e controversos — personagens da história.



