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O que diz a arqueologia sobre a crucificação de Jesus?
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O que diz a arqueologia sobre a crucificação de Jesus?

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Aventuras Na História
15/06/2025 12h00
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A morte e ressurreição de Jesus é uma das histórias mais influentes da história mundial. Um homem de origem humilde, vindo da Galileia, desafia as estruturas religiosas e políticas de seu tempo, é brutalmente executado e, dias depois, segundo os evangelhos, retorna à vida. Para os cristãos, essa é a base da fé. Para os historiadores, é também um dos episódios antigos mais discutidos — e mais difíceis de delimitar com precisão.

A crucificação em si é um ponto de consenso entre especialistas. Ela é mencionada nas cartas do apóstolo Paulo, escritas entre 50 e 65 d.C., que são os primeiros textos cristãos conhecidos. Também aparece detalhada nos quatro evangelhos canônicos, escritos algumas décadas depois, e é citada por autores não cristãos do século II, como o historiador Tácito

Inclusive, a imagem mais antiga conhecida de Jesus pode ter surgido nesse contexto — não como veneração, mas como zombaria: um grafite do século II mostra um homem adorando uma figura crucificada com cabeça de burro.

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Grafite do século II mostra homem adorando uma figura crucificada com cabeça de burro / Crédito: Wikimedia Commons via Domínio Público

No entanto, os detalhes da ressurreição são muito mais controversos e difíceis de comprovar. As narrativas posteriores incluíram elementos miraculosos e interpretações teológicas que dificultam a análise histórica. Mesmo assim, essa narrativa teve impacto decisivo na formação do cristianismo e da cultura ocidental.

Últimos passos de Jesus

Milhares de peregrinos cristãos percorrem todos os anos a Via Dolorosa, em Jerusalém, refazendo o trajeto que, segundo a tradição, teria sido seguido por Jesus entre a condenação e a crucificação. O caminho atual, com cerca de 600 metros, começa na Fortaleza Antônia e termina na Igreja do Santo Sepulcro. 

No entanto, segundo o National Geographic, pesquisas arqueológicas e estudos históricos indicam que essa rota não corresponde ao percurso real feito por ele. O Novo Testamento afirma que a sentença de morte foi proferida em um “pretorium”, termo latino que designava a tenda de um general, mas que, no contexto da Judeia romana, pode ter se referido a um palácio adaptado como sede administrativa. 

A maioria dos historiadores identifica esse local como o palácio de Herodes, situado em uma área diferente da origem da Via Dolorosa atual. Em 2001, escavações localizaram os alicerces desse palácio em um prédio abandonado ao lado do Museu da Torre de Davi.

A partir dali, Jesus teria sido levado até o Gólgota, local da execução, conhecido como “lugar da caveira”. Caso ainda estivesse em condições de caminhar, é provável que tenha carregado apenas a viga transversal da cruz, prática comum nas execuções romanas.

Uma cruz inteira podia pesar cerca de 135 quilos, peso inviável para quem já havia sido torturado. A viga, chamada de patibulum, teria entre 35 e 40 quilos. Fontes romanas, como a peça O Fabricante de Carvão, de Plauto, também fazem referência a esse tipo de carga, reforçando essa interpretação histórica.

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Cristãos percorrendo a Via Dolorosa, em Jerusalém, em 2024 / Crédito: Getty Images

Crucificação

A última parada da Via Dolorosa é a Igreja do Santo Sepulcro, construída na Cidade Velha de Jerusalém. Segundo a tradição cristã, ela marca o local da crucificação e do sepultamento de Jesus. A igreja foi erguida no século IV, por ordem do imperador romano Constantino, cerca de 300 anos após os eventos narrados nos evangelhos.

A identificação do local como autêntico depende de um fator arqueológico: se ele ficava fora dos muros da cidade no século I. Gregos, romanos e judeus consideravam os cadáveres impuros e não permitiam sepultamentos dentro das cidades. Estudos indicam que, na época de Jesus, a área onde está a igreja ainda estava fora dos limites urbanos de Jerusalém, o que sustenta a possibilidade histórica.

No interior da igreja, três pontos são venerados: o Gólgota (local da crucificação), a pedra onde o corpo teria sido preparado e o túmulo de Jesus, hoje protegido por uma estrutura chamada edícula. O local é considerado sagrado por várias tradições cristãs, incluindo católicos romanos, ortodoxos gregos, armênios, coptas, sírios e etíopes.

Embora os evangelhos descrevam Jesus sendo pregado na cruz, por muito tempo estudiosos duvidaram dessa informação. A maioria das vítimas de crucificação no Império Romano era amarrada com cordas, não pregada. A evidência arqueológica é extremamente rara. 

Em 1968, arqueólogos descobriram em Giv'at ha-Mivtar, na periferia norte de Jerusalém, os restos mortais de um homem judeu do século I, conhecido como Jehohanan. Entre os achados, estava um osso do calcanhar com um prego de ferro cravado lateralmente, indicando que ele foi crucificado. A posição do prego sugere que os pés foram fixados de forma lateral à viga vertical da cruz. 

Em 2017, em Fenstanton, Cambridgeshire, no Reino Unido, arqueólogos da Albion Archaeology descobriram outro esqueleto com um prego de ferro atravessando o calcanhar direito. A datação por radiocarbono indicou que os restos datam de aproximadamente 1.700 a 1.900 anos atrás, ou seja, entre os anos 130 e 360 d.C.

A presença do prego sugere que a crucificação era uma prática romana, embora o contexto exato do indivíduo e as circunstâncias de sua morte permaneçam incertos.  Esses dois casos são as únicas evidências físicas confirmadas de crucificação romana. 

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Fotografia do osso calcâneo direito (calcanhar), perfurado por um prego de ferro / Crédito: Reprodução/ Albion Archaeology

Já a associação do túmulo ao local da crucificação vem do evangelho de João, que afirma que havia um jardim “no lugar onde Jesus foi crucificado” e que o sepultamento ocorreu ali por estar próximo. Isso deu origem à tradição de um túmulo escavado na rocha nas proximidades do Gólgota.

No século XIX, arqueólogos protestantes passaram a contestar a autenticidade da Igreja do Santo Sepulcro. Segundo o National Geographic, o general britânico Charles Gordon apontou uma colina a cerca de um quilômetro ao norte da cidade como o verdadeiro Gólgota.

Próximo dali, identificou um túmulo escavado na rocha, conhecido hoje como Túmulo do Jardim. O local passou a ser venerado por grupos evangélicos, que ainda hoje celebram a Páscoa ali. Mas a hipótese é rejeitada por estudiosos.

Em 1986, o arqueólogo Gabriel Barkay demonstrou que o Túmulo do Jardim data da Idade do Ferro, ou seja, foi escavado muitos séculos antes da crucificação. Para os especialistas, não há evidências que sustentem a identificação do local como o túmulo de Jesus.

Entre os que questionam a localização tradicional da Igreja do Santo Sepulcro, uma alternativa ganha destaque. Trata-se de uma antiga pedreira próxima ao Portão do Jardim, mencionado pelo historiador judeu Flávio Josefo

A pesquisadora Joan Taylor, especialista em Novo Testamento, defende essa hipótese. Em um artigo acadêmico, ela argumenta que o termo “Gólgota” não se referia a uma colina com forma de caveira, como popularmente se acredita, mas sim a essa pedreira localizada a oeste de Jerusalém.

Segundo Taylor, o local seria estratégico para execuções. Ficava à beira de uma estrada, o que está de acordo com a prática romana de crucificar criminosos em áreas públicas e visíveis. O objetivo era claro: intimidar a população.

Sepultamento

Os evangelhos relatam que Jesus foi retirado da cruz e sepultado antes do pôr do sol da sexta-feira. Mas essa versão é contestada. Os estudiosos John Dominic Crossan e Bart Ehrman defendem que ele nunca foi enterrado.

Para Crossan e Ehrman, os romanos raramente permitiam sepultamentos formais a condenados por crimes contra o Estado. Em geral, os corpos eram deixados na cruz até apodrecerem ou jogados em valas comuns. Se essa leitura estiver correta, a ideia de um túmulo vazio e de uma ressurreição física perde sustentação.

Apesar disso, o contexto específico de Jerusalém pode ter sido diferente. Flávio Josefo relata que os judeus, mesmo durante guerras, se preocupavam em enterrar os mortos antes do pôr do sol. Ele afirma que até os crucificados eram retirados e enterrados por respeito às leis religiosas. Como a execução de Jesus ocorreu às vésperas da Páscoa, o governador romano Pôncio Pilatos pode ter permitido o sepultamento para evitar distúrbios com a população local.

Segundo os evangelhos, após a crucificação, José de Arimateia pediu a Pilatos o corpo de Jesus e o colocou em um túmulo novo, escavado na rocha. Não há comprovação histórica desse detalhe, mas a arqueóloga Jodi Magness afirmou ao National Geographic que o relato é compatível com os costumes funerários judaicos do século I e com as evidências arqueológicas disponíveis.

A tradição cristã sustenta que o túmulo ficava perto do Gólgota. A maioria dos estudiosos considera a Igreja do Santo Sepulcro o local mais provável da crucificação e sepultamento.

Sobre a ressurreição, os evangelhos relatam que, três dias após a morte, o túmulo foi encontrado vazio. Também descrevem aparições sobrenaturais de anjos e de Jesus ressuscitado. No contexto do século I, esse tipo de narrativa era comum. Havia crença difundida em deuses que morriam e voltavam à vida, como Osíris, Dionísio e Mitra, e era socialmente aceito que os mortos pudessem se comunicar com os vivos.

Não há registros históricos confiáveis que confirmem ou refutem a ressurreição. Em 2016, arqueólogos reabriram o túmulo localizado na edícula do Santo Sepulcro e encontraram o espaço vazio, o que era previsto. É possível que cristãos do século IV tenham escolhido deliberadamente um túmulo vazio como local de peregrinação, independentemente da origem da história, repercute o National Geographic.

Desde os primeiros séculos, críticos do cristianismo sugeriram explicações alternativas. Alguns afirmaram que o corpo de Jesus foi roubado. Outros defenderam que os discípulos, especialmente Maria Madalena, estavam em estado de histeria. Há também quem argumente que eles tiveram visões associadas ao luto, algo comum em pessoas que perderam entes queridos.

Apesar das dúvidas históricas, há um ponto consensual entre os estudiosos: desde o início, os primeiros cristãos realmente acreditaram que Jesus ressuscitou. Essa convicção foi decisiva para a formação e a expansão do cristianismo.

Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião do TIM NEWS, da TIM ou de suas afiliadas.
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