Os bastidores da foto mais polêmica de Tancredo Neves

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No dia 15 de janeiro de 1985, véspera de uma nova constituição, o Brasil conheceu seu último presidente eleito por voto indireto. Escolhido pelo colégio eleitoral, Tancredo Neves seria o primeiro mandante civil desde 1964.
Após anos como governador, senador e primeiro-ministro, a experiência de Tancredo já o classificava como um dos mais importantes políticos brasileiros do século 20. Aclamado pelo colégio, elegeu-se com uma larga vantagem.
Um dia antes de tomar a posse, entretanto, o figurão contraiu uma forte doença que o deixou de cama por meses. Foi nesse período que uma das fotos mais polêmicas da história brasileira foi tirada: com Tancredo enfermo, a imagem deixava diversas dúvidas sobre a saúde do mais novo presidente.

O clique
Em março de 1985, Gervásio Baptista esperava no Aeroporto do Rio de Janeiro quando foi abordado por um policial. Com décadas de fotojornalismo nas costas, o profissional estava a caminho de novo um trabalho, cuja importância ele mal imaginava.
Quase cochichando, o oficial de segurança se aproximou de Gervásio e revelou o destino do voo: ele fotografaria o recém-eleito presidente Tancredo.
Uma vez no Hospital de Base de Brasília, Gervásio foi encarregado de criar uma imagem para tranquilizar o país. A ideia era representar Tancredo se recuperando em uma fotografia alto-astral, com todos seus médicos presentes.
A obra, no entanto, teve o efeito contrário e diversos boatos foram criados e disseminados pela imprensa da época. Tirada no dia 25 de março, a fotografia revelava um Tancredo abatido, claramente enfermo, quase deitado no sofá de seu apartamento.

Uma dúvida cruel
Assim que a imagem foi divulgada, brasileiros começaram a questionar sua veracidade: Tancredo estaria realmente vivo no momento da foto? Reportagens da época diziam que o presidente estava, de fato, acordado, mas dependia de uma enfermeira escondida atrás do sofá — com frascos de soro nas mãos.
Todos os boatos, entretanto, foram rapidamente desbancados por Gervásio.
Por anos, o fotógrafo tentou desmistificar as teorias conspiratórias por trás da imagem. “Se eu não estivesse acompanhando a trajetória da doença, eu não acreditaria que ele sairia tão bem na foto. Ele estava bem”, lembrou, em entrevista antiga ao O Tempo.
No dia da fotografia, inclusive, Gervásio fez questão de tirar todas as partes duvidosas do cenário. “Lembro que o principal médico dele o estava abraçado. Pedi ao doutor que tirasse a mão das costas do presidente, para não dizerem que ele estava sendo amparado”, afirmou o jornalista.

Rumores
Os boatos, é claro, tomaram conta do país em pouco tempo, apesar das objeções de Gervásio. Outra imagem daquele dia, no entanto, era a prova concreta de que Tancredo estava vivo — e bem!
Durante o ensaio fotográfico, a esposa do presidente eleito, dona Risoleta, sentou-se ao lado do marido. Em seguida, um clique apenas dos dois mostrou um Tancredo animado, sorridente e de olhos bem abertos.

Segundo disse Antonio Britto, em Assim morreu Tancredo, a única armação da foto envolveu levar o presidente do quarto até a sala.
Acompanhado de dona Risoleta e de sua enfermeira, que segurava os dois frascos de soro, Tancredo, então, sentou-se no sofá, ao lado de seus médicos. A especialista posicionou os soros atrás do presidente e saiu de cena.
Três horas depois da foto, uma má notícia: Tancredo havia sido acometido por uma hemorragia. Sem saída, os médicos o encaminharam até o Instituto do Coração, em São Paulo. Menos de um mês depois, o presidente sem posse morreu, aos 75 anos, no dia 21 de abril.



