Policiais Civis são alvos de investigação por propina de R$ 1 milhão para encerrar caso do PCC
Contigo!

Um vídeo de pouco mais de dois minutos, gravado em 23 de maio de 2024, tornou-se central em uma investigação que revela como membros da Polícia Civil aceitaram R$ 1 milhão para interromper um inquérito contra Wagner Nascimento de Souza, o Costurado, ligado ao Primeiro Comando da Capital (PCC). Dois policiais foram presos nesta quarta-feira (10/12).
“Eu vou conversar com o escrivão, tá para terça, quarta-feira”, diz Murilo, referindo-se ao escrivão Wander Tadeu de Araújo, citado no processo como peça essencial para formalizar o encerramento do inquérito.
“Tá bom, eu posso ficar tranquilo então, que esse assunto tá encerrado, matou a nota? Ninguém deve nada?”, questiona o advogado, ao que Murilo responde: “Acabou, parou… usa isso a seu favor”, mencionando a negativa judicial a um pedido de busca e apreensão como justificativa para arquivar o caso.
As conversas evidenciam a naturalidade com que o grupo discutia a manipulação de um procedimento sigiloso e o entendimento de que o pagamento acordado selaria o destino da investigação.
Costurado e o interesse do PCC
Costurado, apontado pela PF e pelo Ministério Público de São Paulo (MPSP) como operador financeiro do PCC entre Mato Grosso e São Paulo, havia sido identificado em investigação que descobriu o transporte de 345 kg de cocaína em um caminhão frigorífico.
O avanço das apurações poderia revelar outros integrantes da facção. Foi nesse período — entre o relatório de Murilo e Alan em 8 de maio de 2024 e o vídeo gravado quinze dias depois — que começou a articulação para bloquear o andamento do inquérito.
A denúncia obtida pelo Metrópoles mostra que o relatório final, assinado pelo escrivão Wander, indicou apenas um nome secundário, abrindo caminho para o arquivamento por falta de provas.
O funcionamento interno do Denarc
Segundo o Gaeco, a investigação evidencia a infiltração de interesses privados na estrutura do Denarc. Murilo e Alan tratavam o inquérito como uma negociação, enquanto Wander aparecia como responsável por formalizar o resultado desejado.
Em um trecho, Ademilson pergunta se poderia “ficar tranquilo” e se a investigação “não iria dar nada” para Costurado. Ele é tranquilizado pelo policial:“Acabou, parou… usa isso a seu favor.”
Para o MPSP, a conduta dos três policiais configurou “desvirtuamento de inquérito policial” mediante pagamento ilícito.
Patrimônios incompatíveis
A apuração também aponta aquisições de bens pelos policiais pouco depois do vídeo, incompatíveis com seus salários. Murilo comprou um apartamento de até R$ 1,25 milhão, financiado em parcelas quase equivalentes ao seu salário líquido. Ele ainda possui imóvel em Santos e motocicleta, enquanto sua esposa detém outros quatro imóveis e um Jeep Renegade.
A esposa de Alan, Leda Ferreira da Costa, comprou à vista um apartamento em Osasco por R$ 215 mil, e a família administra empresas com mudanças súbitas de atividade, sugerindo operação econômica artificial. Wander também adquiriu um apartamento e possui outros imóveis e veículos financiados.
Ademilson Alves de Brito, condenado no passado por extorsão mediante sequestro, mantém frota de carros de luxo, incluindo Porsche, Jaguar e Land Rover. Para o Gaeco, o padrão de vida dos envolvidos reforça a suspeita de que o pagamento de R$ 1 milhão financiou essas aquisições.
O destino do dinheiro
O MPSP afirma que o valor acordado visava impedir que Costurado e outros membros do PCC fossem alvo de novas diligências. A negativa judicial a uma busca foi usada como justificativa para “enterrar” o restante do inquérito, que terminou com indiciamento mínimo, mantendo a célula criminosa intacta.
Prisões, buscas e bloqueio de bens
Diante das evidências, o juiz Tiago Ducatti Lino Machado decretou a prisão preventiva de Murilo, Alan e Ademilson, além de mandados de busca e apreensão e bloqueio de bens até R$ 1 milhão. As medidas foram cumpridas pela Polícia Federal com apoio da Corregedoria da Polícia Civil, sem itens ilegais localizados apenas na residência do escrivão, em Mairiporã.
Posição da SSP
A Secretaria de Segurança Pública (SSP) afirmou que não tolera desvios de conduta e adotará todas as medidas administrativas cabíveis, colaborando com as autoridades para esclarecimento completo dos fatos.
A defesa dos policiais não foi localizada; o espaço permanece aberto para manifestações.
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