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'Fóssil vivo' ajuda cientistas a compreender evolução dos vertebrados
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'Fóssil vivo' ajuda cientistas a compreender evolução dos vertebrados

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Aventuras Na História
03/05/2025 16h15
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©Divulgação/NRF-SAIAB 34464/SAIAB
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Um estudo publicado no último dia 30 na revista Science Advances revelou descobertas que podem reformular a compreensão atual sobre a evolução dos vertebrados.

A pesquisa, conduzida por cientistas da Universidade de São Paulo (USP) e da Smithsonian Institution, nos Estados Unidos, analisou detalhadamente a musculatura craniana do celacanto africano (Latimeria chalumnae), um peixe considerado um "fóssil vivo" por manter sua anatomia praticamente inalterada há mais de 65 milhões de anos.

Apesar de já ser um dos peixes mais estudados da história, o celacanto surpreendeu novamente: os pesquisadores constataram que apenas 13% das transformações musculares previamente atribuídas às principais linhagens de vertebrados eram corretas. O estudo também identificou nove novos eventos evolutivos ligados à alimentação e respiração desses grupos.

"Em última instância, ele é ainda mais similar aos peixes cartilaginosos [tubarões, raias e quimeras] e tetrápodes [aves, mamíferos, anfíbios e répteis] do que se pensava. E ainda mais distinto dos peixes de nadadeira raiada, que são cerca de metade dos vertebrados viventes", explica Aléssio Datovo, professor do Museu de Zoologia da USP e autor principal do estudo, de acordo com o portal Galileu.

Entre os equívocos agora corrigidos, está a ideia de que o celacanto possuía músculos responsáveis por expandir ativamente a cavidade bucofaringeana, essencial para sugar alimento e facilitar a respiração. O novo exame anatômico demonstrou que tais estruturas não eram músculos, mas sim ligamentos, incapazes de realizar contrações.

Essas conclusões têm implicações profundas para a história evolutiva dos peixes ósseos. Os peixes de nadadeira raiada (actinopterígeos) e os de nadadeira lobada (sarcopterígeos) — grupo que inclui o celacanto, os peixes pulmonados e todos os tetrápodes — divergiram há cerca de 420 milhões de anos. O mecanismo de sucção para alimentação, observado em espécies como as carpas, só teria surgido bem depois, no ancestral comum dos actinopterígeos modernos.

Peixes como o celacanto e os tubarões, portanto, dependem da mordida direta para capturar suas presas — uma diferença marcante em relação à estratégia de sucção dos peixes de nadadeira raiada.

"Nos estudos anteriores, era dado que esse conjunto de músculos que daria maior capacidade de sucção estava presente também nos celacantos e, portanto, teria evoluído no ancestral comum dos vertebrados ósseos, o que mostramos agora não ser verdade. Isso só surgiu pelo menos 30 milhões de anos depois, no ancestral comum dos peixes de nadadeira raiada viventes", afirma Datovo.

Extremamente raros, os celacantos vivem a cerca de 300 metros de profundidade e passam o dia escondidos em cavernas submarinas. A baixa exposição a predadores e a estabilidade de seu ambiente ajudam a explicar por que sua anatomia evoluiu tão lentamente desde a extinção dos dinossauros, conforme já apontado em um estudo de 2013 publicado na Nature.

Embora os celacantos tenham sido conhecidos por muito tempo apenas por fósseis, um exemplar vivo foi encontrado pela primeira vez em 1938. Vale destacar que apenas em 1999 foi identificada a espécie Latimeria chalumnae nos mares asiáticos.

Para realizar o estudo, os pesquisadores da USP e da Smithsonian precisaram da cooperação de museus estrangeiros para obter espécimes — o Field Museum, de Chicago, e o Virginia Institute of Marine Science, nos EUA, cederam um exemplar cada.

O mérito pela obtenção dos peixes é atribuído a G. David Johnson, coautor do artigo, descrito por Datovo como "provavelmente o maior anatomista de peixes de seu tempo". Johnson faleceu em novembro de 2024, enquanto o artigo ainda era revisado, após um acidente doméstico.

A dissecação dos espécimes, feita por Datovo ao longo de seis meses, permitiu a separação cuidadosa de cada músculo e osso craniano. "Diferente do que se imagina, dissecá-los não significa destruí-los, desde que o procedimento seja feito com rigor", afirma o pesquisador. As estruturas agora estão preservadas individualmente, acessíveis para novos estudos.

Erros corrigidos

Com esse mapeamento inédito da anatomia do celacanto, os pesquisadores conseguiram corrigir diversos erros que vinham sendo repetidos há décadas.

"Havia muitas contradições na literatura. Quando finalmente conseguimos examinar os exemplares, detectamos uma quantidade de erros maior do que imaginávamos. Por exemplo, 11 estruturas descritas como músculos eram, na verdade, ligamentos ou outros tipos de tecido conjuntivo. Isso tem uma consequência drástica para o funcionamento da boca e da respiração, porque músculos performam movimento, enquanto ligamentos apenas o transmitem", explica Datovo.

Dada a posição dos celacantos na árvore evolutiva dos vertebrados, essas correções ajudam a elucidar a trajetória evolutiva de outras linhagens, incluindo a nossa. Com base nos dados obtidos, os autores compararam imagens 3D de crânios de peixes extintos e atuais, disponíveis em bancos digitais, para reconstruir o desenvolvimento muscular nos primeiros vertebrados com mandíbulas.

Nos próximos passos, Datovo pretende comparar essa musculatura com a dos tetrápodes, como répteis e anfíbios, para seguir desvendando as raízes da evolução craniana dos vertebrados terrestres.

Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião do TIM NEWS, da TIM ou de suas afiliadas.
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