Homem com H honra legado de liberdade de Ney Matogrosso | #CineBuzzIndica

Sem mentiras e sem pudor. Esse foi o pedido de Ney Matogrosso ao diretor e roteirista Esmir Filho (Boca a Boca) em sua primeira conversa sobre transformar sua vida e carreira em filme. Sua preocupação era que o público conhecesse um recorte verdadeiro da sua história, longe das mentiras que foram “ditas e escritas” a seu respeito. Anos depois, Homem com H chega aos cinemas honrando a força e a liberdade do cantor.

O longa-metragem começa retratando a infância de Ney, sofrendo agressões físicas e psicológicas do pai, o militar Antônio Matogrosso (Rômulo Braga). Na tentativa de impor que o menino agisse como um “homem de verdade”, aplicava diversos castigos e humilhações. Mas nada foi capaz de aniquilar sua paixão pela arte e encontrar um caminho de liberdade.

A carreira de cantor não foi a primeira opção de Ney. Após ser expulso de casa, serviu a aeronáutica, foi para Brasília tentar ser ator, mas foi no coral que se destacou e entendeu que poderia utilizar técnicas teatrais para expressar sua essência nos palcos.

O responsável por retratar esse espírito indomado é Jesuíta Barbosa (Tatuagem). O ator não apenas impressiona pela semelhança física na caracterização, como também capta brilhantes os trejeitos e expressões de um dos maiores nomes da música brasileira. Essa persona cresce gradualmente e, quando assume o lugar que sempre o pertenceu, é apoteótica.

O público passa a degustar da imensidão que é esse artista quando ele entra na banda Secos e Molhados. O intérprete aceita o desafio de ser vocalista do grupo desconhecido, desde que, dentro do seu metro quadrado de palco, vestisse o que sentia vontade e fosse quem quisesse ser.

Ter enfrentado a figura autoritária paterna ainda na juventude, deu fôlego para Ney confrontar todas as figuras de autoridades e todos os homens que tentaram domá-lo: os namorados tóxicos, empresários, diretores de TV, jornalistas e também militares durante a ditadura.

As 17 canções presentes no longa-metragem foram a coluna vertebral do roteiro, complementos narrativos e visuais da história, que levam o público em uma jornada para conhecer essa personalidade através de letras e performances que marcam cada capítulo de sua vida ao longo das oito décadas.

Cada apresentação foi elaborada e captada pelo diretor e seu parceiro de fotografia, Azul Serra, com um estilo diferente. Em Homem de Neanderthal, Ney é bicho que rasteja no palco e a câmera tem medo de se aproximar; na exuberante Bandido Corazón, a câmera dança com Ney e provoca com seu striptease; Homem com H se inspira em musicais da Broadway como Chicago com cortes da performance e momentos de Ney conhece e explora sua intimidade com Marco; e em Açucar Candy, Ney recebe “as balas do teu 38” com muito prazer. 

Esmir sempre levantou questões sobre afetos, relacionamentos, sexualidade e desejo em suas obras. Homem com H não é tímido em explorar a liberdade sexual de Ney em frente aos holofotes e na vida íntima. Vemos o cantor se jogando em um turbilhão de corpos, suas paixões passageiras, sua versão descompromissada e seu medo do compromisso, mas também seus dois grandes amores: Cazuza (Jullio Reis, S.O.S.: Mulheres ao Mar 2) e Marco De Maria (Bruno Montaleone, Perdida). 

Ao falar sobre Ney, o longa-metragem também fala sobre a história do Brasil, que, por sinal, era um país bem menos conservador e mais destemido. São oito décadas de história, uma vida inteira que não cabe em um único filme, mas que ao longo de mais de duas horas de duração, Homem com H consegue desmistificar o ícone da MPB que se tornou um dos grandes símbolos de coragem, liberdade e resistência no país.

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