As incríveis artes chinesas que representam Jesus e Maria

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Quando Matteo Ricci, missionário jesuíta italiano, chegou à China em 1583, levou consigo não apenas a fé cristã, mas também o desejo de construir uma ponte entre Oriente e Ocidente.
Sua missão, para além da evangelização, envolvia o intercâmbio cultural, algo que o religioso entendeu ser essencial para dialogar com os valores profundamente enraizados da civilização chinesa.
Essa abordagem resultaria, com o passar dos séculos, em uma notável fusão entre a arte cristã ocidental e as tradições visuais chinesas, criando representações únicas e fascinantes de figuras como Jesus e a Virgem Maria.
Primeiros registros
O primeiro registro dessas imagens cristãs em solo chinês se deu graças a quatro pinturas religiosas levadas por Ricci, que chegaram às mãos do comerciante de tinta e fabricante de bolos Cheng Dayue. Este, impressionado pelas obras, incluiu reproduções comentadas no seu catálogo ilustrado "Jardim de Tinta da Família Cheng", publicado em 1605.

Segundo informações do portal Sixth Tone, o volume em questão entrou para a história como o primeiro a conter imagens de Jesus e Maria produzidas em território chinês. Era o início de um processo de localização das imagens sagradas, moldadas agora pelos traços, valores e simbologias da cultura chinesa.
Décadas mais tarde, outro missionário, Juliano Aleni, ampliaria esse diálogo ao publicar, em 1637, o livro "A Vida Ilustrada de Jesus", baseado nas imagens do jesuíta espanhol Jéronimo Nadal.
Aleni, diz a fonte, transformou gravuras europeias em xilogravuras no estilo chinês, mantendo traços ocidentais como olhos fundos, cabelos cacheados e narizes altos, mas adornando as figuras com vestimentas e elementos visuais chineses. Cada uma das 56 ilustrações do livro vinha acompanhada de descrições em chinês clássico, tornando as histórias bíblicas mais acessíveis ao público local.

Universidade Católica
No século 20, com o surgimento da República da China, artistas nacionais passaram a se apropriar dessas imagens com ainda mais liberdade criativa. A fundação da Universidade Católica Fu Jen, em 1925, com o apoio do Papa Pio XI, tornou-se um polo artístico importante.
Ali lecionou Chen Yuandu (ou Luke Chen, como era conhecido), um dos pioneiros na aplicação das técnicas tradicionais de pincel e tinta da pintura chinesa para retratar cenas bíblicas.
Ele adaptou símbolos típicos, como a auréola sagrada, fundindo-a com elementos chineses, e explorou a proximidade entre a Virgem Maria e Guanyin, o bodhisattva da compaixão no budismo chinês — um paralelo cultural que favoreceu a aceitação popular da figura mariana.
Chen influenciou uma geração de artistas, entre eles Lu Hongnian, que retratou a Virgem com vestimentas tradicionais chinesas envolta por nuvens, e Wang Suda, conhecido por reinventar a "Última Ceia" com estética tipicamente chinesa, desde as roupas dos apóstolos até os utensílios sobre a mesa.
Em uma de suas obras mais marcantes, Wang representou Maria como uma imperatriz da dinastia Ming, com coroa de dragão e fênix, símbolos do poder supremo.

Teatro e música
A criatividade não parou nas artes visuais. Representações de Jesus e Maria também foram adaptadas ao teatro e à música. Um exemplo é a ópera regional de Henan, que apresentou o nascimento de Jesus em Zhumadian, cidade chinesa, substituindo os presentes dos reis magos por carne, maçãs e macarrão.
Também vale destacar a canção "Jesus Baby", que narra de forma poética e bem-humorada o nascimento de Cristo em um contexto completamente chinês, com José preparando bolinhos e um lojista oferecendo chá de gengibre com açúcar mascavo para aquecer Maria.


