Afinal, será que os famosos multivitamínicos trazem benefícios para a saúde? Entenda
Bons Fluidos

É fácil entender o apelo: engolir uma cápsula de multivitamínicos parece mais simples do que ajustar alimentação, sono e rotina de exercícios. Só que, na prática, boa parte das promessas não se apoia em evidências robustas – e não existe comprimido capaz de “consertar” uma dieta desequilibrada.
Outro ponto pouco lembrado: suplementos não são regulados pela FDA (Food and Drug Administration) do mesmo modo que os medicamentos, o que pede uma avaliação real de risco-benefício. Em resumo: podem ajudar em cenários específicos, mas não são isentos de efeitos indesejáveis ou interações com remédios. A regra de ouro continua valendo: conversar com um profissional de saúde antes de começar algo novo.
Popularidade x evidência: onde estamos
Multivitamínicos estão entre os campeões de vendas no mercado de wellness, muito por uma ideia de proteção ampla: viver mais, reduzir risco de câncer e evitar doenças cardiovasculares. Estudos grandes trazem um quadro mais sóbrio. Um trabalho publicado no JAMA Network Open acompanhou quase 400 mil adultos por cerca de três décadas e não encontrou ganho de longevidade com o uso rotineiro. O que segue no topo das prioridades? Padrões alimentares consistentes, que já demonstraram reduzir risco de doenças crônicas.
Para que servem (e para que não servem)
Multivitamínicos complementam lacunas, mas não substituem uma alimentação variada – que oferece não só vitaminas e minerais, mas fibras, proteínas, gorduras de qualidade e fitoquímicos presentes nos alimentos integrais. Em algumas situações (idosos, gestantes, veganos, pessoas com condições clínicas específicas), a suplementação direcionada pode ser útil. Para quem tem dieta equilibrada e exames em dia, a necessidade diária de um “combo” costuma ser baixa.
Fórmulas variam bastante em composição, dosagem e qualidade. Existem versões por faixa etária e por sexo, e produtos com selos e rastreabilidade melhores do que outros. O risco é supor que “quanto mais, melhor”. Doses elevadas, sobretudo das vitaminas lipossolúveis A, D, E e K, podem se acumular e causar toxicidade. Mesmo nutrientes eliminados na urina, como vitamina C ou magnésio, em excesso podem provocar diarreia, náusea e sobrecarga renal. Ajustar a dose por conta própria não é uma boa ideia.
O mito do “xixi caro” – e por que ele faz pensar
Quando não há deficiência, o excedente de várias vitaminas simplesmente é excretado – daí a brincadeira de que multivitamínico vira “xixi caro”. No cenário oposto, o excesso pode fazer mal: vitamina A em altas doses aumenta risco de problemas hepáticos, osteoporose e defeitos congênitos; vitamina E em suplemento associou-se a pior desfecho cardiovascular em determinados contextos. E não dá para ignorar interações com medicamentos. Tudo isso reforça a importância de avaliar se e o que suplementar.
Há estudos pontuais com resultados mistos: em idosos, por exemplo, um ensaio pequeno encontrou sinais modestos de melhora em memória e função executiva após alguns anos; por outro lado, acompanhamentos maiores não confirmaram proteção contra doenças cardiovasculares ou declínio cognitivo, indicando no máximo reduções discretas em desfechos como incidência de câncer ou catarata. Esses resultados, sozinhos, não justificam o uso indiscriminado.
Quando suplementar faz sentido
A decisão deve partir de avaliação clínica e, idealmente, exames laboratoriais. Em algumas situações, a suplementação pode ser indicada. Por exemplo: gestação ou tentativa de engravidar; vegetarianos e veganos; idosos; deficiência de vitaminas ou má absorção delas; outros contextos clínicos (como alergias ou intolerâncias alimentares).
Se a suplementação for a indicação, priorize produtos de marcas confiáveis, com rótulos claros e dosagens compatíveis com sua necessidade. Evite megadoses, não duplique fórmulas (ex.: multivitamínico + pré-treino que já contém vitaminas) e refaça exames no prazo orientado para ajustar a estratégia. O foco é corrigir déficits reais, não colecionar cápsulas.
Suplementos podem ter papel importante quando bem indicados. Mas o que mais transforma saúde, no longo prazo, continua sendo o básico bem-feito: prato colorido, movimento diário, sono de qualidade, manejo do estresse, consultas regulares. Cápsulas podem somar; substituir, não.

