Novembro Azul: o que a neurociência revela sobre a resistência masculina aos exames de próstata
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Novembro Azul marca a importância dos cuidados com a saúde masculina – especialmente em relação ao câncer de próstata. Conhecido como o tipo mais frequente de câncer entre os homens, a doença ainda enfrenta outro desafio: muitos homens ainda resistem aos exames preventivos, mesmo com evidências claras de que o diagnóstico precoce salva vidas. Por isso, em meio ao tema, destaca-se a urgência da conscientização sobre a doença.
Segundo o Globocan, da Agência Internacional para Pesquisa em Câncer (IARC/OMS), mais de 1,4 milhão de novos casos são diagnosticados globalmente todos os anos, resultando em cerca de 397 mil mortes. No Brasil, o Instituto Nacional de Câncer (Inca) estima 71.730 novos diagnósticos anuais, fazendo do câncer de próstata o tipo mais frequente entre os homens (atrás apenas do de pele não melanoma). Os dados revelam um impacto profundo: um brasileiro morre da doença a cada 39 minutos.
Um cenário desigual e um desafio nacional
As taxas de incidência variam entre as regiões, refletindo desigualdades de acesso à informação e saúde. O Sudeste lidera com mais de 34 mil casos anuais, seguido pelo Nordeste com 21 mil. Estados como Bahia e Espírito Santo figuram entre os mais afetados, com índices acima de 70 casos por 100 mil homens.
A Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica recomenda iniciar o rastreamento aos 45 anos para homens com fatores de risco, como histórico familiar ou ascendência negra, e aos 50 para os demais. O protocolo inclui PSA anual e toque retal. O impacto é direto: segundo o National Cancer Institute (EUA), 69% dos casos diagnosticados precocemente têm 100% de sobrevida em cinco anos, enquanto tumores metastáticos reduzem esse índice para 37,9%.
Mas por que, então, tantos homens seguem evitando a prevenção?
Para o Pós-PhD em Neurociências, o Dr. Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues, a explicação vai muito além do tabu. “Quando um homem pensa em exame de próstata, PSA ou toque retal, muitas vezes não é o corpo que trava primeiro, é a cabeça”, afirma.
“O cérebro interpreta o exame como uma ameaça simbólica dupla: à saúde e à identidade masculina. Amígdala e ínsula disparam o alarme, o cíngulo anterior marca o conflito entre medo e dever, o pré-frontal tenta segurar a onda. Se vem alívio rápido ao adiar, o estriado registra que evitar reduz ansiedade e transforma a fuga em hábito”, explica o neurocientista. Esse mesmo circuito, diz ele, afasta homens de cardiologistas mesmo com pressão alta ou de clínicos em casos de glicemia alterada.
Masculinidade, identidade e negação
A formação cultural masculina também pesa – e muito. Para a neuropsicóloga Dra. Leninha Wagner, o cérebro aprende regras sociais que moldam comportamentos de risco. “A socialização masculina coloca valor em controle, produtividade e invulnerabilidade. O cérebro aprende essa regra social. Surge uma equação perversa: admitir dor parece fraqueza, cuidar de si parece luxo”.
“Esse padrão cobra um preço alto. Estresse crônico, sono fragmentado, piora do humor e abuso de álcool entram em cena como tentativas de regulação emocional. O resultado é um ciclo que adia o diagnóstico e aumenta a gravidade dos casos”.
Como “reprogramar” o cérebro para o autocuidado?
Mesmo com tantas barreiras psicológicas, a mudança é possível, de acordo com o médico urologista e uropediatria, Dr. Pedro Leite. “Mudar o comportamento é possível quando se reduz a ameaça à autoimagem e se facilita a primeira ação. Autoafirmação funciona. Plano ‘se-então’ transforma vontade em ato: se for segunda às nove, eu ligo e marco o PSA”, destaca o especialista.
Segundo ele, campanhas eficientes devem dialogar com o modo como o cérebro processa esforço e recompensa: consultas pré-marcadas; horários estendidos; linguagem clara; ausência de estigmas; redução do constrangimento. “Vergonha empurra para o esconderijo, culpa focada no caráter paralisa. Culpa focada no comportamento traz reparo: eu adiei, agora vou marcar. Campanhas que associam cuidado com competência mudam a narrativa”, destaca.
Sobre os entrevistados
Dra. Leninha Wagner é PhD em neurociências, possui formação em neuropsicologia, é Doutora em psicologia, Mestre em psicanálise e Perita Judicial em Psicologia, fundadora da Substância Singular Psicologia Clínica. Também atua na área de psicometria realizando testagem de QI, é palestrante e realiza consultorias particulares como mediadora de conflitos organizacionais.
Dr. Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues é Pós-PhD em Neurociências. Foi eleito membro da Sigma Xi – The Scientific Research Honor Society, além de ser membro da Society for Neuroscience nos Estados Unidos, da Royal Society of Biology e da The Royal Society of Medicine no Reino Unido, da The European Society of Human Genetics em Vienna, Austria e da APA – American Philosophical Association nos Estados Unidos. Mestre em Psicologia, Licenciado em História e Biologia, também é Tecnólogo em Antropologia e Filosofia, com diversas formações nacionais e internacionais em Neurociências e Neuropsicologia.
Dr. Pedro Henrique Borba é médico urologista e uropediatra graduado em Medicina pela UFMS (2011) com residência Médica em Urologia pela Faculdade de Medicina do ABC, fellowship em urologia pediátrica e vasta experiência em cirurgia reconstrutiva urogenital e tratamento de disfunções miccionais em adultos e crianças. Atualmente é membro do Gifted debate do CPAH – Centro de Pesquisa e Análises Heráclito.
*Fontes: Angela Rocha e MF Press Global
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