Diários de adolescentes soviéticos revelam resistência ao regime de Stalin
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Um novo estudo, publicado na revista Slavic Review, lança luz sobre uma faceta pouco conhecida da vida na União Soviética sob Josef Stalin: os diários pessoais de adolescentes entre 1930 e 1941. A pesquisa, conduzida pela historiadora russa Ekaterina Zadirko como parte de seu doutorado na Universidade de Cambridge, analisa 25 diários e revela como jovens soviéticos processavam as contradições de crescer sob um regime autoritário — misturando as dores universais da adolescência com as agruras de um tempo marcado por repressão, fome e guerra iminente.
A investigação desafia o estereótipo de uma juventude moldada pela doutrinação. "Os estudiosos tendem a desconsiderar o conteúdo desses diários como meras preocupações da adolescência", afirma Zadirko. "Mas, nos anos 1930, escrever era uma forma crucial de os adolescentes lidarem com a chegada à vida adulta e encontrarem seu lugar em uma sociedade profundamente controlada".
Revelações
Entre os diários mais reveladores está o de Ivan Khripunov, filho de um camponês classificado como kulak — termo usado para rotular os camponeses considerados burgueses rurais e, portanto, inimigos do povo. Khripunov registrou sua vida desde os 14 anos, em 1937, até seu alistamento forçado no Exército Vermelho em 1941. Sua escrita, inspirada no estilo literário de Máximo Gorki, narra a fome, o exílio do pai e a vergonha pública da família, atingida pela campanha de deskulakização.
Em passagens marcantes, Ivan acusa diretamente o Estado soviético pela fome que assolou sua família, descrevendo como recolhiam espigas do chão para sobreviver — uma prática proibida pela chamada "Lei das Três Espiguetas".
Sem pão e nosso pai, nós estávamos famintos", anotou o jovem.
A escrita desses adolescentes revela um embate entre seus sentimentos e as exigências da ideologia soviética. Eles buscavam amor, sentido e identidade enquanto eram pressionados a se tornarem o "novo homem soviético": abnegado, produtivo e ideologicamente puro. Meninas eram descritas não apenas por sua aparência, mas por seu desempenho político e escolar. Emoções como paixão e insegurança eram cuidadosamente filtradas pelo vocabulário do dever coletivo.
Muitos desses jovens também refletiam sobre o futuro com angústia. David Samoilov, que anos depois se tornaria um dos principais poetas russos do século 20, escreveu em 1936: "Sou completamente sem talento... Mas serei de alguma utilidade para a sociedade em que vivo?". Outros, como Ivan, não tiveram tempo de descobrir. Ele desapareceu no front menos de um ano após registrar: "A guerra transforma todos em adultos".
A pesquisa mostra que, mesmo em um contexto de vigilância e censura, os jovens encontravam na escrita íntima um espaço de liberdade e resistência simbólica. "Mesmo que os diários fossem privados, o ato de escrever era arriscado", ressalta Zadirko. "Eles improvisavam com os recursos ideológicos disponíveis e mantinham o senso de identidade da adolescência".
Hoje, esses relatos, preservados em parte pelo arquivo digital Prozhito, oferecem um raro vislumbre de um passado íntimo e quase perdido. Segundo a 'Revista Galileu', mais que documentos históricos, são testemunhos emocionantes de jovens tentando compreender quem eram, em meio a um dos períodos mais sombrios da história moderna.