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'Tá vendo aquela fumaça? São eles': A história do brasileiro nascido em campo nazista
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'Tá vendo aquela fumaça? São eles': A história do brasileiro nascido em campo nazista

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Aventuras Na História
29/04/2025 03h00
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George Legmann tem uma vida única, que reflete os horrores da Segunda Guerra Mundial, mas que também traz esperança em tempos sombrios e incertos. Um verdadeiro sobrevivente. Exemplo de superação!

Judeu de origem romena, foi sinônimo de vida no campo da morte. Afinal, foi o primeiro entre os sete bebês nascidos no campo de concentração de Dachau, em 8 de dezembro de 1944, no sul da Alemanha.

Neste 29 de abril, completa-se 80 anos desde que as tropas norte-americanas libertaram o primeiro campo construído pelos nazistas. Por lá, as forças Aliadas encontraram cerca de 30.000 prisioneiros morrendo de inanição. Num cenário que jamais será esquecido.

Mas é da resiliência que está história é escrita. Hoje, com 80 anos, o brasileiro George Legmann conta em entrevista exclusiva à equipe do Aventuras na História sobre as intempéries que viveu, sem esquecer de todos os motivos que lhe fizeram continuar. Leia!

As deportações

Em 1940, os húngaros se aliaram aos nazistas em pleno auge da Segunda Guerra Mundial. Como resultado do Segundo Arbitragem de Viena, o país dominou parte da Romênia, mais especificamente a Transilvânia do Norte, em novembro daquele ano.

A região, que um dia fez parte do Império austro-húngaro, é a mesma onde os Legmann moravam, no caso, a mãe, o pai, o tio materno, a avó e o avô materno de George. Em abril de 1944, os judeus começaram a ser deportados para os campos de concentração. Os familiares de George Legmann foram pararam no principal deles: Auschwitz-Birkenau.

Entrada de trem de Auschwitz - Getty Images

"Começam a deportar os judeus. Todos foram postos num vagão de gado com condições higiênicas zero. O trem ia pela ferrovia, passa na planície húngara. E, numa parada, porque os trens eram a carvão e água, os trens precisavam ser reabastecidos. Deram uma olhada em cada vagão, mas não fecharam muito bem a porta de onde estava meu pai e meu pai se jogou do vagão em movimento. Ele disse para seus parentes: 'eu vou vir buscar vocês'", conta George em entrevista exclusiva à equipe da Aventuras na História.

Quando seus familiares chegaram em Auschwitz-Birkenau, Legmann recorda que eles foram recebidos pelo Anjo da Morte. "Estava o Josef Mengele, o grande médico nazista".

Logos, os judeus começaram a ser separados nas plataformas, não só por gênero, mas também entre aqueles que estavam aptos, ou não, para o trabalho forçado. "Avisaram que quem não estivesse apto para trabalhar ou não estivesse se sentindo bem, poderiam entrar nos caminhões que estavam à disposição Que iriam levar as pessoas para suas acomodações, seus dormitórios".

"Meu tio materno, que na época tinha 16 anos, ele tinha pisado num prego no trem e infeccionou o pé dele. Ele estava com problemas para andar e não podia andar. Ele entrou num desses caminhões junto com meu avô materno", explica Legmann.

No entanto, tudo não passava de uma mentira dita pelos oficiais nazistas. O tio e o avô de George foram imediatamente levados para as câmeras de gás. "Eles faleceram três ou quatro horas depois que chegaram em Auschwitz-Bierkenau".

A minha mãe perguntou para alguém: 'você sabe para onde foram o meu pai e meu irmão?' e falaram: 'você está vendo aquela fumaça que está saindo por aquela chaminé? eles estão saindo por lá'", retrata.

A mãe e a avó de George foram selecionadas para diversos trabalhos forçados em campos de concentração e saíram da Polônia indo até a Alemanha. "Na Alemanha, elas passaram por quatro campos antes de chegarem no campo de Dachau".

"Dachau foi o primeiro campo de concentração que os nazistas fizeram para seus desafetos políticos", contextualiza. "Dachau serviu para campo modelo para outros campos que foram feitos depois".

Gravidez no campo

Durante o período em que estivessem nos campos, os prisioneiros eram obrigados a trabalharem em siderúrgicas, fábricas de munições, construção de estradas ou até mesmo dentro de outros campos. Uma forma de sustentar a guerra.

Nessa altura, a mãe de George, que já sabia que estava grávida, contou com a ajuda de um médico judeu que também havia sido preso; o que possibilitou que ela escondesse a gravidez até os últimos momentos da guerra.

Mas tudo mudou em outubro de 1944, quando a gravidez foi descoberta por um médico alemão responsável pelo campo. Na verdade, não era somente a mãe de George que esperava um bebê, outras seis mulheres tiveram filhos por lá entre dezembro de 1944 e fevereiro de 1945. George Legmann foi primeiro deles a nascer, no dia 8.

"O médico nazista de Dachau, entre 15 e 20 de outubro de 1944, faz um controle do campo e acha sete mulheres grávidas. Ele pega e telegrafa para Auschwitz e informa o chefe dele informando que achou sete mulheres grávidas e pede orientação", descreve Legmann.

Como resposta, o oficial ouviu que as tropas soviéticas e norte-americanas já estavam invadindo os territórios polonês e alemão. "Este médico tinha trabalhado antes na França ocupada, onde ele ajudou a matar 11 mil membros da resistência francesa".

Ele achou por bem deixarem essas mulheres darem à luz, porque eram álibis para ele quando chegassem as tropas aliadas", conta. "Depois da Segunda Guerra, ele foi julgado em Nuremberg e foi executado pelo que ele fez na França ocupada".

Quase 'adoção' e sobrevivência

Mas antes disso, em dezembro de 1944, a esposa e o filho desse médico nazistas, que moravam em Munique, acabaram sendo mortos após um bombardeiro da Força Aérea Britânica (RAF) na cidade alemã. Como consequência, o nazista tentou adotar George para ser seu filho. "Eu tinha aproximadamente três semanas de vida. Branco desbotado, olhos claros, parecia ariano", relata.

George disse que o médico nazista explicou para sua mãe o que havia acontecido com sua família e lhe fez uma proposta: "Você vai me dar seu filho, porque meu filho faleceu. Ninguém vai saber que ele é judeu. Eu vou adotar seu filho, você vai sobreviver. Eu vou deixar você escapar e fugir".

Mas ela jamais abriria mão de seu filho. "Minha mãe era uma pessoa muito forte e ela falou: 'se ele vier a me matar, ou matar meu filho, as outras mães vão denunciar ele. Portanto, se ele tiver juízo, visto que já sabiam o que ele havia feito na França ocupada, ele não vai matar ninguém, ou então ele não vai ter o álibi'".

Ela correu o risco e falou: 'se é para morrer, então vamos morrer todos'".

Não só a mãe de George e ele sobreviveram ao conflito, como todas as mulheres que estavam grávidas e seus bebês. Mas não, sem antes, passarem por mais um episódio que poderia custar suas vidas.

Judias com seus filhos, após a libertação de Dachau (George Legmann é o 1º bebê da direita para a esquerda)
/ Crédito: Dominio Público

"O pessoal do Exército americano, o médico-chefe, achou melhor, por problemas de saúde e dermatológicos, subnutrição, levar essas mães com seus bebês para um convento que estava há uns 25 ou 50 quilômetros, para se estabelecerem e depois verificar o que iria acontecer em seguida", recorda Legmann.

As mulheres foram colocadas no último vagão do comboio, que estava acoplado em um trem de carga. "Por engano, com a Guerra já terminada, há aproximadamente duas semanas, a RAF bombardeia esse trem achando que era um trem nazista".

Ele destrói a locomotiva inteira, todos os vagões. Menos o último vagão, que onde estavam as cinco mães e os cinco bebês. Eles se salvaram todos", finaliza George Legmann.

Hoje com 80 anos, George Legmann vive no Brasil desde o início dos anos 1960, quando tinha 16 anos, e se já se considera, com razão, um autêntico brasileiro.  

Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião do TIM NEWS, da TIM ou de suas afiliadas.
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