Balduíno IV: O glorioso e trágico 'Rei Leproso' de Jerusalém

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Quando se fala sobre o período medieval, muitas vezes pensamos em regiões onde hoje estão a Inglaterra, a Espanha, a França ou Itália. Porém, na região onde hoje está Israel, a Faixa de Gaza, a Cisjordânia, e até parte do Egito, já havia o chamado Reino de Jerusalém, estabelecido pelos cruzados em 1099, e que teve sua dissolução em 1291.
Nessa história relativamente breve, um príncipe medieval chegou a ficar bastante conhecido, com uma história especialmente única: Balduíno IV, também chamado de "Rei Leproso".
Vale mencionar que, antes da descoberta relativamente recente da cura para a hanseníase (outro nome pelo qual a lepra é conhecida), contrair essa doença era basicamente uma sentença de morte.
E o pior: uma morte lenta e dolorosa, com lesões na pele que ficavam cada vez maiores — além do estigma de que esses doentes eram "impuros", e, por isso, expulsos para viver em colônias de doentes.
Balduíno IV
Filho do rei Amalrico I de Jerusalém, Balduíno IV nasceu em 1161 e, ainda jovem, com apenas nove anos, manifestou os primeiros sinais de que sofria com a lepra. Quem os percebeu foi seu tutor, o historiador e futuro arcebispo Guilherme de Tiro, que a detectou quando Balduíno, após brigar com amigos, relatou não sentir dor nenhuma no braço direito.
Porém, ao contrário do que era comum, que os leprosos fossem isolados e marginalizados, o menino foi protegido por sua posição na realeza. Vale destacar que, nessa época, a linhagem real era vista como formada por nomeados por Deus, de forma que foi um verdadeiro espanto aos muçulmanos locais que alguém não fosse condenado a viver em solidão, ao contrair a doença.
Porém, mesmo doente, o jovem príncipe seguiu demonstrando possuir uma mente afiada, e até mesmo provou-se um cavaleiro bastante habilidoso. E com apenas 13 anos, após a morte de seu pai em 1174, acabou sendo elevado a uma posição de extremo poder: tornou-se o rei de Jerusalém.

Lutando por Jerusalém
Assim que Balduíno IV iniciou seu reinado, Jerusalém se viu ameaçada pelo sultão Saladino, um antigo chefe militar curdo muçulmano que liderou a oposição islâmica aos cruzados na região — de grande importância religiosa tanto para cristãos, quanto para muçulmanos. O Reino de Jerusalém, por sua vez, foi estabelecido pelos franceses, cristãos.
Mesmo que possuísse um exército, nessa época era esperado que uma disputa entre reis fosse, de fato, lutada com eles nas linhas de frente. E mesmo com sua doença, Balduínonão se sentiu impedido de enfrentar suas próprias batalhas.
No mesmo ano em que foi coroado, ele organizou um ataque bem-sucedido contra Damasco, justamente com a intenção de levar Saladino para longe de Aleppo. E apenas dois anos depois, ele já estava mais uma vez na linha de frente, liderando suas tropas na contenção dos ataques muçulmanos em Damasco e Andujar.

Devido à lepra, ele só podia segurar as rédeas de um cavalo com uma mão. Ainda assim, ele cavalgou à frente do exército na lendária Batalha de Montgisard, no Egito, onde finalmente o sultão Saladino foi morto.
Herói
Com as vitórias, Balduíno foi visto por seu povo como um verdadeiro herói, superando o estigma de sua doença, e sendo capaz de esmagar um dos exércitos mais poderosos do mundo, repelindo a "ameaça muçulmana". Isso tudo, é claro, sem deixar de se provar um líder perfeitamente capaz e sensato também fora dos campos de batalha.
E para além de sua coragem como soldado e intelecto como líder, Balduíno também foi admirado por sua castidade ao longo da vida — afinal, nessa época, pessoas com lepra eram frequentemente estereotipadas como extremamente lascivas.
Inclusive, alguns historiadores até mesmo sugerem que o rei inspirou certo nível de tolerância aos leprosos nas comunidades cristãs, mesmo que a doença seguisse estigmatizada por muito mais tempo.
Para descontentar os que conhecem o "Rei Leproso" em filmes de ficção, não há relatos contemporâneos a Balduíno que confirmem que ele usava máscaras ou tentava cobrir o rosto de alguma forma, conforme repercute o All That's Interesting.

Na verdade, nos primeiros anos de seu reinado, não havia qualquer sinal externo da doença em seu corpo. Foi somente mais perto do fim de sua vida que desenvolveu úlceras visíveis, e até ficou cego, além de sofrer com febres frequentes e pela incapacidade de andar corretamente.
Morte
Por mais que ainda sua inteligência ainda estivesse intacta, por volta dos 24 anos Balduíno percebeu que seu corpo estava finalmente sucumbindo à doença. Ele inclusive se ofereceu a abdicar do trono conforme a condição piorava, mas a oferta foi recusada, tamanha a estima que seu povo tinha por ele.

O jovem Balduíno permaneceu em Jerusalém como rei até sua morte, em 1185, com apenas 24 anos. Mas, longe de ser rejeitado e desprezado por sofrer com a lepra, tornou-se ainda mais querido por seu povo ao enfrentar a doença com coragem e se provar um líder capaz, encerrando assim um dos reinados mais bem-sucedidos que se pode imaginar.


