Home
Notícias
Da rota do incenso ao sumidouro: A cidade perdida de Ubar, a Atlântida das Areias
Notícias

Da rota do incenso ao sumidouro: A cidade perdida de Ubar, a Atlântida das Areias

publisherLogo
Aventuras Na História
05/07/2025 12h00
icon_WhatsApp
icon_facebook
icon_email
https://timnews.com.br/system/images/photos/16555617/original/open-uri20250705-35-5sr3nu?1751716816
©Reprodução/Google Earth
icon_WhatsApp
icon_facebook
icon_email
PUBLICIDADE

Na região desértica de Rub’al Khali, no sul de Omã, ecoa há séculos a lenda de uma cidade próspera que teria desaparecido sob a areia, engolida por um castigo divino ou por uma catástrofe natural. Esse lugar mítico atende por vários nomes: Ūbār, Awbār, Wabār ou, para muitos exploradores ocidentais, simplesmente “Atlântida das Areias”.

A comparação com a Atlântida foi cunhada pelo explorador britânico Bertram Thomas, na década de 1930, quando percorreu o sul da Arábia. Ele espalhou a história no Ocidente, alimentando o fascínio por encontrar essa cidade perdida.

O nome Ubar está, até hoje, envolto em equívocos. Muitos acreditam que a cidade é mencionada no Alcorão ou em "As Mil e Uma Noites". Na realidade, não há qualquer citação direta nessas fontes. A confusão vem da associação entre Ubar e Iram, a chamada “cidade das colunas” mencionada no livro sagrado do Islã, mas essa ligação não é amplamente aceita pelos estudiosos.

Hoje, sabe-se que a Iram mencionada nos textos sagrados está provavelmente ligada à região de Wadi Rum, na Jordânia, onde inscrições safaíticas mencionam tanto “Iram” quanto a antiga tribo de ‘Ad. Mas então, o que se sabe sobre a cidade perdida de Ubar?

A lenda de Ubar

A tradição oral beduína fala de uma cidade fabulosa, rica em tesouros, erguida no deserto. Segundo essas histórias, seus habitantes teriam vivido em luxo e pecado, provocando a ira divina que os sepultou sob as dunas. Para alguns, Ubar teria sido a capital do rei ‘Ad, descrito como cruel e arrogante.

Um relato registrado por Bertram Thomas afirma que seus guias beduínos apontaram trilhas entre as dunas dizendo: “Ali está o caminho para Ubar. Era rica em tesouros, tinha jardins de tâmaras e uma fortaleza de prata vermelha. Agora jaz sob as areias da Ramlat Shu'ait”. Mesmo sem provas, a história seduziu exploradores durante todo o século 20.

Entre os primeiros a perseguir o mito esteve o arqueólogo Thomas Edward Lawrence, convencido de que existiam vestígios de uma civilização árabe soterrada no deserto. Planejou sobrevoar o Rub' al Khali, o “Bairro Vazio”, com dirigíveis, mas nunca conseguiu realizar essa empreitada.

Wilfred Thesiger, outro explorador britânico, passou pela região em 1946. Ao visitar o poço de Shisr, encontrou as ruínas de um forte de pedra sobre um afloramento rochoso. Identificou fragmentos de cerâmica que poderiam ser islâmicos, mas concluiu que o lugar não passava de um poço vital para beduínos e palco de antigos combates.

Em 1948, geólogos da Petroleum Development (Oman and Dhofar) Ltd. também chegaram a Shisr. Descreveram a visão de um paredão branco que, à distância, parecia um penhasco, mas se revelou ser o muro de um forte em ruínas sobre uma caverna calcária, parcialmente soterrada por dunas. Chamaram aquilo de uma ruína sem importância, pré-islâmica, usada por poucas famílias e sem indícios de grande cidade. 

A descoberta de 1990

A virada na história veio em 1992, quando o cineasta e escritor Nicholas Clapp, fascinado pelo relato de Bertram Thomas, resolveu buscar Ubar de maneira científica. Consultou mapas antigos, como o de Ptolemeu do século 2 d.C., que mostrava o “Omanum Emporium” — uma cidade comercial no sul da Arábia — e levantou a hipótese de que Ubar poderia ser este entreposto.

Clapp teve a ideia de usar tecnologia de ponta: pediu à NASA imagens de radar por satélite. O sensoriamento remoto revelou rotas de caravanas antigas, escondidas sob dunas de até 100 metros de altura, todas convergindo para um ponto: o poço de Shisr, no Dhofar, sul de Omã.

Acompanhado do arqueólogo Juris Zarins e do aventureiro Ranulph Fiennes, Clapp iniciou escavações. Embaixo das ruínas do velho forte, encontraram vestígios de uma estrutura muito mais antiga: uma fortaleza octogonal, datada de cerca de dois mil anos atrás. Um enorme platô de calcário sustentava a entrada principal, mas parte dele havia desabado num sumidouro profundo, criando uma dolina que engoliu parte das muralhas e o poço.

O achado arqueológico trouxe detalhes fascinantes. Segundo o livro "Atlântida das Areias: A Busca pela Cidade Perdida de Ubar", de Finneas, a fortaleza não era apenas um ponto defensivo: servia de residência real, centro administrativo, local de armazenamento e processamento do precioso olíbano — a resina aromática que dominou as rotas comerciais da Antiguidade.

Em tempos de crise, servia como refúgio. Seus muros nunca foram violados. Era cercada por oito paredes, cada uma com cerca de 60 cm de espessura, entre 3 e 3,6 metros de altura e cerca de 18 metros de comprimento. Nos cantos erguiam-se torres cilíndricas com 3 metros de diâmetro e 9 metros de altura.

Essas torres são a principal evidência que liga Shisr às descrições corânicas de Iram como “a cidade das muitas colunas, cuja igual jamais foi construída em toda a terra.” Além disso, fragmentos de cerâmica, contas, moedas e outros objetos indicavam ligações comerciais amplas, indo da Pérsia até Roma e a Grécia, sendo um entreposto vital da rota do incenso.

Sob debate 

Apesar do entusiasmo inicial, a descoberta foi logo envolvida em debate. Clapp defendeu que Shisr fosse Ubar, mas Zarins, embora participante das escavações, discordou. Para ele, Ubar não era uma cidade específica, mas uma região ou povo, identificada nos mapas de Ptolemeu como “Iobaritae”. 

“Há muita confusão em torno desse nome. Ubar se refere a uma região e a um povo, não a uma cidade específica. Foi só nas versões medievais de As Mil e Uma Noites que Ubar se transformou numa cidade lendária", disse em uma entrevista em 1996.

Outros estudiosos sustentam a mesma linha. Em um artigo, o geólogo H. Stewart Edgell observa que o deserto do Rub' al Khali é inóspito há pelo menos seis mil anos, tornando improvável a existência de qualquer grande cidade estável ali. Para ele, Shisr foi, no máximo, uma hospedaria que servia algumas famílias e não uma metrópole soterrada.

Seja lá o que Ubar foi, sua queda parece estar ligada a fatores naturais e econômicos. O sumidouro que engoliu parte da fortaleza pode ter sido provocado por extração excessiva de água subterrânea, fragilizando o solo calcário. Mas a ruína definitiva veio quando o comércio de incenso entrou em colapso.

Com a cristianização do Império Romano, a demanda por incenso diminuiu drasticamente. Além disso, rotas marítimas tornaram-se mais seguras e rápidas do que as longas caravanas pelo deserto. Sem comércio, os entrepostos como Shisr perderam importância e foram abandonados devido ao avanço das dunas.

Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião do TIM NEWS, da TIM ou de suas afiliadas.
icon_WhatsApp
icon_facebook
icon_email
PUBLICIDADE
Confira também