Os mistérios em torno da morte de Lampião e Maria Bonita

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Há 87 anos, no dia 28 de julho de 1938, aconteceu na Grota do Angico, em Sergipe, um episódio bastante marcante para a história do nordeste brasileiro: a morte de Lampião e Maria Bonita, o rei e a rainha do cangaço, bem como a de vários membros do "Bando de Lampião", também colocando um ponto final na história do cangaço.
Durante 18 anos, Virgulino Ferreira da Silva — mais conhecido como Lampião — foi líder de um bando que contou com mais de 40 cangaceiros, e ficou conhecido principalmente por cometer e comandar crimes pelo nordeste brasileiro, que iam desde saques de cidades até sequestros e assassinatos.

Porém, mesmo que tenha sido declarado pelas autoridades como inimigo público, o cangaço também foi visto, em sua época, como um movimento de combate às desigualdades e aos apelos de políticos e fazendeiros que ocupavam grande parte da região. Assim, não demorou para que Lampião se tornasse um grande protagonista na cultura nordestina — e também uma figura controversa.
Emboscada
Por seus crimes, Lampião chegou a ser procurado vivo ou morto por autoridades de diferentes estados, o que culminou na emboscada às 5 da manhã de 28 de julho de 1938. O que se considera é que ele morreu após ser atingido por três tiros, um na cabeça, ainda no local — e não só ele, como Maria Bonita e outros cangaceiros foram decapitados e tiveram as cabeças expostas em várias cidades.
Porém, mesmo que já tenha se passado tanto tempo, até hoje não há uma conclusão definitiva sobre como foi a morte de Lampião, com teorias sugerindo vários outros motivos para a morte — assim, questionando parcialmente a versão das autoridades —, como envenenamento, e que a polícia disparou contra o grupo já morto, ou até mesmo duvidando que ele morreu na emboscada, e teria vivido até os 100 anos, morrendo em Minas Gerais.
Hoje, conforme destaca a BBC, a versão mais aceita da morte de Lampião foi descrita pelo escritor Frederico Pernambucano de Mello no livro 'Apagando Lampião', em que ele escreve que Lampião morreu com um único tiro disparado a oito metros de distância pelo cabo Sebastião Vieira Sandes com um fuzil — ele mesmo teria relatado o acontecimento ao escritor em 2003, quando quis revelar o que seria seu maior segredo após descobrir uma doença terminal.
Nova perícia
João Marcos Carvalho, historiador, jornalista e autor do documentário 'Os Últimos Dias do Rei do Cangaço' foi responsável por pedir mais recentemente ao perito Victor Portela, do Instituto de Criminalística de Alagoas uma nova perícia nas roupas e objetos que estavam com Lampião no dia da emboscada, que hoje ficam guardadas como relíquias no Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas.
À BBC News Brasil, o perito disse que aceitou a missão de imediato, e que iniciou a análise do punhal, das cartucheiras e dos bornais (bolsas de couro usadas pelo cangaço) de Lampião ainda em 2018. E algo que destacou das análises é que foram percebidos pontos de impacto e perfurações nos materiais em questão.
Segundo o laudo de Portela, foram três tiros contra o cangaceiro. O primeiro acertou o punhal — e essa bala acabou desviando e atingindo o cangaceiro na região umbilical —, outro atravessou a cartucheira, que ficava no ombro, e atingiu o coração de Lampião; e o terceiro, finalmente, o atingiu na cabeça.

Dúvidas
O perito destaca que é impossível saber qual dos tiros foi o verdadeiro causador da morte de Lampião, ou mesmo se foi a combinação deles. Porém, acrescenta que os disparos no peito e na barriga não o matariam instantaneamente, e que "ele poderia morrer alguns minutos depois pelo sangramento. Só o tiro na cabeça o mataria rápido, mas não temos como dizer a cronologia dos disparos".
Um dos novos pontos apresentados no laudo recente, feito através da análise dos bornais, que tinham duas marcas de tiro, chamou atenção especial dos pesquisadores. Isso porque João Marcos acredita que o cangaceiro não teve tempo de vesti-los durante o tiroteio.
Quando o bando chegou à grota, o local não estava em um silêncio de catedral. Lampião estava vestindo a cartucheira, o punhal e tomou os tiros ali. Não deu tempo de ele vestir os bornais", explicou.
Portela, por sua vez, concorda com isso ao revelar que a perícia mostrou que os tiros foram feitos de cima para baixo, e que os bornais sequer apresentavam marcas de sangue. "Ficou uma incógnita com relação aos bornais, mas quando fiz a sobreposição das cartucheiras com os bornais, vi que não há compatibilidade com nenhum dos disparos".
Agora, ainda é motivo de grande discussão como realmente se deu os detalhes da emboscada e da morte de Lampião, Maria Bonita e dos demais membros do bando. Mas certamente o legado e o impacto cultural do cangaço para o nordeste vive até hoje, quase nove décadas após seu fim.



